Até 73% dos erros que acontecem dentro de hospitais brasileiros, como medicações trocadas ou operação de membros errados, poderiam ser evitados. É o que apontam estudos da Fiocruz apresentados no QualiHosp (congresso de qualidade em serviços de saúde) e que ajudaram o Ministério da Saúde a criar novas normas de segurança hospitalar, que passam a valer a partir de 2014. As pesquisas, feitas em dois hospitais públicos do Rio, encontraram uma incidência média de 8,4% de eventos adversos, semelhante aos índices internacionais.
No Brasil, no entanto, é alto o índice de problemas evitáveis: de 66,7% a 73%. Em outros países, a incidência variou de 27% (França) a 51% (Austrália).
Em números absolutos, isso significa que, em 2008, dos 11,1 milhões de internados no SUS, 563 mil foram vítimas de erros evitáveis. Para Walter Mendes, pesquisador da Fiocruz e consultor do comitê do programa de segurança do paciente, embora haja limitações metodológicas ao extrapolar os resultados para o resto do país, os estudos indicam a magnitude do problema. “É um quadro barra pesada. Nos países desenvolvidos, existem políticas de segurança bem consolidadas. Aqui estamos acordando com um pouco de atraso”, diz ele.
Segundo Mendes, a política de segurança do paciente não pode ser vista em separado do “imenso caos” que vive a maioria dos hospitais. “A questão é adotar mecanismos impeçam que o erro chegue ao doente”, afirma. A morte da menina Stephanie Teixeira, 12, que no ano passado recebeu vaselina em vez de soro nas veias, é um exemplo de erro evitável. Os frascos eram idênticos, e os nomes dos produtos estavam em etiqueta de mesma cor.
Para Angela Maria da Paz, gerente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), esses casos acontecem porque as instituições não seguem protocolos. “Existem ferramentas capazes de prevenir esse tipo de erro.” No Brasil, diz ela, os eventos adversos são subnotificados e, em geral, só se tornam visíveis quando viram caso de polícia. “Existe a cultura do castigo, as pessoas escondem, têm medo. O erro deve ser aproveitado como aprendizado, não para punição.”
Para o professor Jesús María Aranaz Andrés, chefe do serviço de medicina preventiva do hospital Sant Joan d’Alacant (Espanha), a reparação do erro pode ser resolvida de várias formas, como pela compreensão e correção ou por indenização. “Só não pode haver culpabilização porque isso leva à ocultação. Se escondermos a cabeça na areia feito avestruz, não vamos aprender.”
O pesquisador Paulo Santos Sousa, professor da Universidade Nova de Lisboa (Portugal), diz que as mudanças devem ser de cultura. “Bactéria não tem asas. Ela passa de paciente para paciente porque alguém a carregou nas mãos. Sempre se soube que lavar as mãos é importante, mas continua sendo um desafio.”
Segundo Angela Paz, da Anvisa, a agência construirá uma ferramenta eletrônica para monitorar os eventos adversos e agir na prevenção. Um dos pontos da política, segundo ela, é uma negociação com o Ministério da Educação para que as faculdades de medicina coloquem em seus currículos o tema de segurança do paciente. Outra ideia é disseminar essas informações ao paciente para que ele se torne atuante no processo, e não um mero espectador.
| Escrito por Marco Zanfra - assessoria de comunicação/Fetessesc.